Caim - José Saramago
O meu primeiro contacto com Saramago foi há 2 anos, quando estava a estudar O ano da morte de Ricardo Reis no 12º ano. Antes disso, estava num hiato de leitura há alguns anos: pouco lia e esse pouco também pouco me trazia. Foi esta obra que me estendeu a mão e me fez reencontrar com a escrita, dando início a uma nova fase da minha vida enquanto leitora.
O verão que se seguiu após concluir o 12º foi recheado com outras obras do único Nobel português: O homem duplicado, Ensaio sobre a cegueira e, o meu favorito de todos, As intermitências da morte. Desde aí que, por puro acaso, que nunca mais li nada de Saramago até, há umas semanas, ter visto este livro na biblioteca municipal e decidido que estava na hora de voltar a mergulhar na obra deste autor que tanto me trouxe.
Lúcifer sabia bem o que fazia quando se rebelou contra deus, há quem diga que o fez por inveja e não é certo, o que ele conhecia era a maligna natureza do sujeito
A personagem principal, tal como o título assim indica, é Caim, o assassino bíblico do próprio irmão. Após ser castigado por Deus, Caim parte numa viagem em que o presente é repleto de diversos passados e futuros. O fratricida experiencia em primeira mão vários dos acontecimentos descritos no Antigo Testamento: assiste à construção da arca de Noé, à destruição de Sodoma e conhece Abraão.
Para caim nunca haverá alegria, caim é o que matou o irmão, caim é o que nasceu para ver o inenarrável, caim é o que odeia deus.
Apesar de me considerar ateia e de nunca ter tido um grande contacto com o cristianismo ao longo da minha vida, acho extremamente cativantes as histórias que fazem uso da mitologia e a reconstroem para criar algo diferente do original.
Caim não foi, claramente, exceção. Aliada à escrita e à utilização cativante dos recursos estilísticos a que já estou habituada de Saramago, esta reestruturação do canône cristão deixou-me completamente agarrada e foram poucos os dias que demorei a lê-la.
Após terminar o livro, fui investigar e descobri as já expectáveis críticas da igreja católica ao mesmo, visto que nos é apresentada uma imagem de deus muito afastada do tradicional bom, sempre justo e perfeito.
A história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus, nem ele nos entende a nós, nem nós o entendemos a ele.
Ao longo dos próximos dias, continuarei a refletir sobre esta obra e sobre a minha visão da religião. Acho que, no final das contas, é isso que se pede de um bom livro: que nos abra as portas ao pensamento.
Classificação: ★★★★☆